Foto de Vera Costa |
Este lindo texto foi publicado no mural de uma amiga do facebook. Ela também uma artista sensível e que em um dia daqueles em que estamos desacreditando da humanidade chega para nos aquecer a alma e fazer surgir uma chama de esperança na humanidade.
Pedimos então autorização para a autora e resolvemos publicar aqui no blog. Esperamos que gostem.
EsquadrãoPet
Num dia comum, como outro qualquer, vi um desses carroceiros carregando um móvel usado, não consegui identificar o que era, mas sabia que tinha madeira e vidro e à primeira vista me agradou. Parei o carroceiro e fiz uma módica oferta, ele aceitou e acrescentou que se eu gostava de coisas velhas, ele poderia conseguir mais.
Levei o móvel para casa e identifiquei que era um bar, de colocar bebidas e copos. Todo arredondado. Emoldurado em madeira de boa qualidade e envidraçado com cristal bisotê também arredondados; uma obra de arte. Mas estava avariado. Lixei a madeira para tirar a tinta esmalte branca que tinha derramado na carrocinha. Mandei colocar o vidro que faltava e passei graxa de sapato marrom, o que deu uma cor e um toque aveludado na madeira. Poli com flanela e o coloquei num lugar de destaque na sala. É comum as visitas elogiarem e acreditarem que é uma peça de família ou de antiquário. Não conheço a categoria e classificação do móvel, mas sei que é coisa boa e valiosa.
Dias depois andando pela minha rua para fazer alguma coisa comum, como comprar cigarros ou leite, não me lembro, a vi na esquina. Foi a mesma sensação de quando vi meu móvel barzinho, não entendi direito o que era, sabia que era coisa boa. Tentei me aproximar, mas ela fugiu assustada.
Comecei a encontra-la diariamente. Estava sempre lá na mesma esquina que a tinha visto pela primeira vez. Suja, magra e assustada, mas eu via o potencial de ficar bonita, saudável e feliz. Demorou muito, mas muito mesmo, coisa de uns 3 meses, para que ela deixa-se eu me aproximar e dar um pouco de comida e 8 meses para confiar nas minhas intenções e decidir ir morar comigo.
Estava com ela na rua e uma vizinha, que eu nem sei o nome, disse: "Ah! A senhora arrumou um cachorro. Aquele que morava na esquina, acho que morreu. Nunca mais vi."
Contei que era o mesmo cachorro, mas ela não acreditou. Eu entendi. Tinha pouco pelo, pesava uns 6 kls, carregava uns 30 carrapatos que foram retirados a unha e o rabo sempre entre as pernas. Quando a vizinha anônima a viu novamente, pesava 15 kls, peluda, sedosa e limpa com uma postura ereta de cão de exposição. Algumas pessoas chegaram a perguntar qual era a raça. Bom, para quem acredita em vidas passadas, o tataravô dela, na encarnação passada, era pastor alemão. Entendeu?
As pessoas começaram a jurar que coisas boas iriam acontecer, em resposta ao ato de bondade que tinha feito. Era comum essas pessoas me dizerem: "Deus te abençõe!" E eu respondia: " Amém!"
Meses depois meu casamento começou a naufragar.
Fomos a terapia de casal, por insistência minha e ele contratou um advogado, por vontade própria.
Caso a separação se concretiza-se, o móvel e o cão ficariam comigo. Na época em que discutíamos a separação um ladrão entrou na nossa casa e levou tudo, menos o barzinho e o cão.
Não havia mais coisas a serem divididas, o ladrão tinha resolvido isso por nós. Ficamos muito felizes por nosso cãozinho estar bem, nem traumatizada ela estava.
Tínhamos perdido de uma só vez tudo que tinha levado anos para comprar. Restou o Barzinho, o cão e uma relação avariada.
Como eu já conhecia a técnica de recuperar coisas avariadas e parir confiança em solos pouco férteis, resolvi fazer bricolagem naquela relação.
Com meu respeito às coisas velhas fui recuperando os estragos que o tempo e nossa inabilidade tinham cometido. Tirando uma ferrugem daqui, colocando um verniz ali.
A experiência de ter recuperado uma obra de arte do lixo e transformado uma S.R.D numa " Mini Pastora Alemã de Pelos Longos e Orelhas Caídas", me ajudaram muito a restaurar aquela obra de arte avariada, a polir aquela genuína relação.
Kate San, obrigada por me ensinar um pouco da sua sabedoria todos os dias e me fazer um ser humano melhor.
Vera Costa (mamys da Kate San)
Abaixo uma matéria do projeto Calendário Celebridade Vira Lata de alguns anos atrás que a Kate San participou.
Muito bom!
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